quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Areias errantes


Percorre-me os espaços desertos do corpo…pregos em pó desfeitos espetados na armadura ferrugenta das noites mal dormidas. Sonhos de infância, graúdas realidades nos berlindes esquecidos no bolor pardacento do ser errante. Ao longe o infinito feito de finitas alergias a sóis que nunca se põem e se alimentam de sombras que vestem a esperança moribunda.
Devora o deserto equívocos e lamentos … fartas armadilhas onde aprisiona poesias de oásis ainda por inventar.
Castelos de areia onde permanecem escondidas as letras felizes da palavra. Altivas …num jogo de esconde-esconde tornam-se a negação da sua essência, espelham desejos e oferecem amargura sedenta.
Lapsos do pensamento que se perdem na abertura de uma luz sem feixes onde o riso se esfuma como fumo em espiral escorregadia.
Embrulho-me em armas…que matam ilusões, que enterram alegrias dormentes… fingidas de respirares rarefeitos.
Apodrecem sementes de um não germinado amor!
Polvilhado grito num desespero de não-sentires e penso que há mil vidas atrás olhei para ti e pensei: visto-me com a areia que trazes nas tuas mãos…és o meu mar em cada noite que passas em mim!
Fez-se de areia...deserto de areia a engolir quartos minguante de tresmalhadas memórias!



Nota: Se puderem passem pelo blog do Nuno Sousa http://nunosousaphoto.blogspot.com/ e vejam o texto que escrevi e principalmente a magnífica foto que ele tirou.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Instinto da minha carne



Mordisco os lábios pintados
De vermelho sangue…
Cobre a palidez da minha face!
Escorre o rio de paixão
Até à fonte que sacia
A inocência perdida.
Arde o fogo entre o sentir
Entrelaçado no tronco nú
Adormecido ao meu lado!
Prolongo o beijo na memória
Quando de ti resta o cheiro
Do prazer saciado!
Adormeço aninhada
Nos braços do desejo
Instinto desperto na minha carne!

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Melodiosos quereres...


Quero...
conjugar para ti o verbo querer
sentir que o posso fazer rimar com perder...perderes-te nas minhas mãos que entrelaçadas adormecem no teu colo!

Quero...
encher as palavras com as marcas de desejo espalhadas no esboço dos teus retratos... partículas perdidas dentro de nós, abraçadas às palavras da tua boca, com que nas noites de insónia estremeço!

Quero...
arrastar pela estrada de terra os riscos dos risos que me fazes soltar...calcorrear caminhos proibidos nos pés que o teu corpo me oferece, para soltar balões coloridos do brilho do teu olhar!

Quero...
a descoberta dos pontos cardeais na ponta da carícia dos teus dedos... navegar nesse mar…onde o destino se veste de enigmático desconhecido e onde as ondas são carícias melodiosas do teu querer!

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Sorriso de lua



Parecia uma aranha com patas de seda a atravessar o seu corpo. Sensações de cócegas vibravam na carne quente recém desperta.
Os fios de ouro que entravam pelos frisos da persiana mal fechada beijavam-lhe a pele vestida com o suor dos prazeres da madrugada.
Adivinhou os traços da sua presença, mas o olhar parou na sequência de cartazes de Toulouse-Lautrec que coloriam a parede daquele quarto tão estranhamente familiar. Sentia-se presa no enredo das saias folhadas daquelas bailarinas do Moulin Rouge e deixou-se invadir pelos amarelos-torrados e pelo vermelho-sangue que lhe tingia o olhar.
Na quietude da cama revolvida pela revolução dos corpos ansiosos e famintos sonhou-se naquela sala revestida a fumo, onde se respirava desejo, aquecido pela transpiração dos corpos em movimento que alimentavam a fome de olhares dormentes e sequiosos.
Estremeceu, deitada, ao som dos ritmos quentes que lhe atiçavam o corpo. Ondas de paixão cobriam-lhe o corpo desnudo, sentiu-o espantado na carícia ardente que o transportou até si. A dança que partilhavam tinha passos diferentes mas conduzia-os sempre a um intenso orgasmo.
Momentos plenos em que fugia das repressões que se impôs. Diluía em si todos os mistérios que não compreendia e abandonava-os momentaneamente.
Sentia-se culpada por estar ali, aliás, tinha o péssimo hábito de se sentir culpada sempre que se sentia num limite de felicidade acima do normal.
Por mais que se esforçasse já não se conseguia lembrar da última vez que riu ruidosamente, por se sentir apenas…feliz!
Também não era infeliz…indiferente, talvez.
Receava saborear o patamar mais elevado da felicidade, escondia-se das ilusões que uma vez por outra a tentavam abraçar.
De mansinho, como uma onda suave do mediterrâneo, ele entrou nela para ficar. Segredou-lhe palavras que ela temia ouvir e que a fizeram estremecer, lambeu-lhe as lágrimas secas e deu-lhe brilho ao olhar, acariciou-lhe as emoções tornando-as tão fortes que ela não conseguiu fugir-lhes.
Sentia-se bem, quase feliz com aquele sorriso de lua que ele lhe oferecia.
Ainda não tinha vencido o medo, mas sabia que com as suas mãos de veludo conseguiria dar um passo de cada vez!